AS QUATRO ESTAÇÕES DO CASAMENTO - Parte 3

cONTINUAÇÃO- O INVERNO: A ESTAÇÃO DAS CRISES
1.2.2 – O sentimento de solidão e rejeição. Sentir um misto de solidão e rejeição é um outro sinal de relacionamentos com a temperatura afetiva baixa. Como conseqüência direta do problema anterior, a comunicação bloqueada, algumas pessoas sentem-se solitárias e rejeitadas mesmo dentro do casamento. É importante ressaltar que tais sentimentos podem acompanhar uma pessoa desde muito cedo, desde a mais tenra infância, o que significa, portanto, que, em alguns casos, os sentimentos de solidão e rejeição não nasceram no casamento, mas, infelizmente, foram por ele amplificados. Há casais que entram no relacionamento a dois apenas por uma projeção, um tipo de ilusão psicológica que distorce a realidade e cria a expectativa de que o outro vai me dar aquilo que eu não tive na infância; nesta projeção, a pessoa pensa que suas carências afetivas serão supridas no matrimonio perfeito, porque ela está casando com a pessoa certa... Este é o ambiente perfeito para que as primeiras dificuldades se transformem numa crise e joguem o casamento no inverno.
O casamento é um espaço vivencial planejado por Deus para acabar com a solidão: “não é bom que o homem esteja só, far-lhe-ei uma auxiliadora...”. Ao mesmo tempo, quando Deus criou o primeiro casal e Adão (acordando da anestesia geral da primeira cirurgia da história da humanidade, a retirada de uma costela), diz “esta é osso dos meus ossos e carne da minha carne”. A falta de uma boa comunicação torna a vida muito solitária. Pessoas solitárias sofrem diariamente da dor difusa, quase indefinível mas bastante angustiante da rejeição. Sim, se você se sente só no casamento, esta não é a vontade de Deus. Sim, o casamento foi planejado por Deus para nos suprir emocionalmente com o mais importante combustível para os relacionamentos: a aceitação. É por isso que a Bíblia diz, antes da queda, antes do pecado, acerca de nossos pais Adão e Eva: “Ora, um e outro, o homem e sua mulher, estavam nus e não se envergonhavam.” (Gn. 2:25), é a cumplicidade total, é o fim da solidão, é a aceitação integral oferecida ao outro, despidos do medo da rejeição, sem máscaras e sem ter do que se envergonhar. Um casamento no inverno é um relacionamento que está muito distante desta bênção...
De que maneira a rejeição se perpetua no inverno? Basicamente de duas maneiras, quando caímos em duas ciladas, que podem ser sutis e até mesmo inconscientes, mas que, ainda assim, transmitem ao outro a mensagem subliminar da rejeição. Primeiramente, um cônjuge mostra rejeição ao outro quando procura transformar aquele que está ao seu lado numa cópia exata de si mesmo.
Norman Wright (1990, p. 172) comenta assim esta questão:
“Se realmente amar seu cônjuge, não haverá exigências, sutis ou de qualquer outra forma, de que ele se transforme numa versão modificada de suas idéias... Evite dar ao outro a impressão de que você só fica feliz quando ele ou ela concorda com você.”
Deus nos fez únicos, e quando uma pessoa se transforma naquilo que o outro quer só para agradá-lo, só para se sentir aceito, ela se transformou num rascunho horrível de outra pessoa e se afastou daquilo que Deus planejou de maneira única e especial para cada ser criado. Ajustamento é um dos sacrifícios necessários ao casamento. Não sejamos tolos, todas as coisas boas exigem sacrifícios. Uma das maiores mentiras do inimigo das nossas almas é fazer as pessoas pensarem que o investimento num casamento feliz e os sacrifícios que as partes fazem para que todos da família ganhem não valem à pena... Vale sim, porque, humanamente falando, uma família feliz é a melhor de todas as experiências que uma pessoa pode desfrutar. Poder, dinheiro, sucesso, status são quase nada quando comparados a uma família feliz.
Todavia, não confunda ajustamento com anulação. O mundo diz que o casamento sufoca a individualidade. Isto só é verdade quando um dos cônjuges despoticamente e insensivelmente sufoca a personalidade do outro, não permitindo ao outro sequer expressar sua opinião, seu gosto, sua preferência sem mostrar reprovação e rejeição. A mutualidade do casamento é uma construção de duas individualidades que se somam e se completam, e não que se anulam. Se existir no casamento cumplicidade e mutualidade é porque as duas personalidades, esposo e esposa, se encontraram e somaram suas diferenças tornando o casamento mais rico. Que me perdoem os nobres colegas exegetas e hermeneutas e suas questões de contexto, mas eu gosto muito de pensar que “melhor é serem dois...”.
Em segundo lugar, perpetuamos o inverno quando nossos diálogos só tratam de problemas, defeitos e coisas em que o outro precisa mudar. O inverno é a estação da neblina, o que dificulta muito a visão. No inverno dos relacionamentos temos a tendência de ver o pior, enxergando apenas as dificuldades, o lado negativo das coisas. Há um provérbio que diz “um pessimista derruba cinco otimistas.” Bárbara Chesser (1993, p. 42) chama nossa atenção:
“...infelizmente [existem] casamentos nos quais os cônjuges só conversam quando há algo errado. Raramente dirigem um elogio ao outro. São presas do mito de que os cônjuges precisam se concentrar nos defeitos do casamento para poderem eliminá-los. Ou podem cair no hábito desanimador de concentra-se no negativo, sem nenhuma intenção ou desejo particular de fazer melhorias. [Estes] deixam de perceber que os casamentos mais satisfatórios são edificados sobre as qualidades dos dois cônjuges, não sobre a preocupação com seus defeitos.”
Quando o casamento está com o clima frio, os ataques aos problemas facilmente são transformados em ataques pessoais, fazendo com que a pessoa criticada sinta-se rejeitada, pois mesmo uma crítica conduzida a um comportamento ou a um jeito de ser que nos é peculiar, é recebida e sentida emocionalmente pelo nosso ego não como algo à parte de nós, mas como um ataque à nossa própria pessoa. Quando a esposa reclama do marido dizendo “poxa vida, como você faz bagunça, eu detesto bagunça”, o outro, por estar no inverno, pode interpretar o que a esposa falou assim “quer dizer que eu sou bagunceiro, ela não gosta de bagunça, então, ela não gosta de mim...”.
Assim, sentimo-nos rejeitados, pois não é tão simples ouvir sobre nossos defeitos, mesmo quando a pessoa que fala o faz com toda a verdade e cuidado; mexer numa ferida sempre dói porque nossos pensamentos não conseguem distinguir, separar muito bem a diferença entre “ele (a) não gosta disto ou daquilo que eu faço” e “ele (a) não gosta mesmo é de mim”. Isto pode até parecer infantil, mas, na minha experiência como conselheiro, a maioria das crises conjugais começam por coisas infantis. O ser humano é muito complexo... Quando um casamento está no inverno fica difícil separar estas coisas. Quando o cônjuge diz que não gosta de algo em nós, lá no fundo, o que nós ouvimos, emocional e distorcidamente por causa das crises, é que ele não gosta de nós.
Como uma pessoa começa a ficar desanimada pela rejeição no casamento? Quando a maioria das conversas descambam para falar dos defeitos. Como o sentimento de solidão atinge o casamento? Quando a comunicação bloqueada distancia marido e mulher. Sem comunicação as pessoas podem estar perto geograficamente, morando na mesma casa e até dormindo na mesma cama, mas, emocionalmente, elas estão a quilômetros de distância um do outro, uma no pólo sul e outra no pólo norte!
Continuaremos na próxima quinzena!