ADUBANDO O JARDIM: A SEXUALIDADE - Parte 13
Restaurando relacionamentos - A Festa de Babette.
A Festa de Babette é um grande livro, tanto que foi coroado na década de 80 com filme de mesmo título. Ele foi escrito por Isak Dinesen - pseudônimo de Karen Blixen, dinamarquesa, casada com um barão que passou de 1914 a 1931 administrando uma plantação de café no leste da África, numa região sob o domínio britânico. O livro é uma obra inteligente e forte sobre o amor e seus resultados.
A história do livro se passa na pobre aldeia de pescadores de Norre Vosburg (Noruega), onde um velho ministro protestante, viúvo há anos, liderava um pequeno grupo de aldeões. Para eles os prazeres considerados “mundanos” eram totalmente condenados. Todos se vestiam de preto e comiam uma sopa de pão com bacalhau cozido, com sabor um pouco estranho. Eles procuravam viver longe de qualquer aparência de prazer ou beleza. Diziam que viviam centrados na Nova Jerusalém, a vida na terra era uma mera formalidade para chegar lá.
O Velho pastor tinha duas belas jovens filhas, Martine e Philipa. Martine recebeu seu nome por causa de Martinho Lutero e Philipa por causa de Philip Melanchton, auxiliar e companheiro do famoso reformador alemão.
Um jovem oficial da cavalaria que fora visitar sua tia na aldeia se encantou por Martine, mas ela resistiu ao relacionamento, apesar de movida pelos olhares e investidas do jovem. Afinal quem iria cuidar de seu velho pai?
Philipa tinha um voz belíssima. Um certo dia Achile Papin, famoso cantor da Ópera de Paris, que estava em viagem de descanso, a ouviu cantar e disse que ela tinha a voz digna de Grand Opera de Paris. A jovem resistiu ao convite e encantos de Papin para uma vida em Paris pelos mesmos motivos de sua irmã; contudo ela e Papin tornaram-se grandes amigos.
Passados muitos anos, o pai das moças morreu. Elas agora eram mulheres solteiras de meia-idade e passaram a liderar a comunidade. Muitas outras coisas também mudaram. Havia boatos de um caso de sexo ilícito há mais 20 anos. Duas senhoras membros da comunidade não se falavam há 10 anos. Embora o clima não fosse bom na comunidade protestante as filhas do velho ministro continuavam tocando o culto e reuniões, e os membros participavam, mas sem entusiasmo e sinceridade.
Certa noite chuvosa as irmãs ouviram uma forte batida na porta Era uma mulher encharcada, exausta e com muito frio trazendo uma carta na mão. Seu nome era Babette. Trazia uma carta de Papin. O cantor pedia que as irmãs a recebessem pois Babete tivera que fugir da guerra civil francesa. No bilhete dizia Papin: Babette é uma amiga, por favor cuidem dela. “Babette sabe cozinhar”. As irmãs pobres ficaram preocupadas, pois não tinham como pagar aquela mulher, apesar das dificuldades receberam Babette que viveu muitos anos servindo à mesa da casa das irmãs. A hóspede e serviçal jamais se referia a seu passado.
O livro conta que um dia, após mais de dez anos, Babette recebeu uma carta de um amigo francês falando sobre um grandioso prêmio de loteria ganhado por Babette, haja vista que todos aqueles anos o amigo tinha renovado um bilhete de loteria de Batette. Seu prêmio chegou junto com o plano das irmãs de comemorar com um culto e jantar o centenário de nascimento do falecido ministro e pai. Babette pediu as irmãs que ela ofertasse o jantar como forma de agradecimento.
Para o grande dia Babette tinha encomendado vários ingredientes da França, inclusive louças, talheres, vinhos e champagne. Outra grande surpresa estava ainda por vir. O jovem oficial que tinha cortejado Matine voltara para visitar sua velha tia, agora como general. E, obviamente, iria participar do jantar.
O grande dia chegou. Nevava lá fora, mas o interior da casa estava aconchegante. Velas, uma linda toalha de renda, talheres de prata e copos e taças de cristal enfeitavam a mesa. A recepção de cada convidado era especial. Os pratos servidos foram os mais especiais de Paris. Em dado momento do jantar o General exclamou: impressionante que fino Amontillado, este é um dos melhores vinhos que já provei. E quando experimentara um dos pratos servidos disse: isto é Blinis Demidoff - um dos melhores pratos de um dos mais importantes restaurantes de Paris, o Café Anglais.
Mesmo sem ter a mesma percepção do General os convidados foram contagiados pelo ambiente de grandiosidade e beleza do jantar e pela gentileza e bondade com que Babette os servia. Tudo aquilo teve um efeito mágico. As senhoras que não se falavam se abraçaram. O homem e mulher que mantinham um caso oculto confessaram seus pecados e foram perdoados. Todos se renovaram. Neste clima o general tomou a taça para um brinde e fez um forte discurso falando do encontro da misericórdia e a verdade naquele jantar.
A festa de Babette termina com dois quadros. Um com os membros da comunidade se abraçando e se alegrando juntos do lado de fora, dançando e pulando como crianças na neve por terem restaurado a alegria e vários relacionamentos. E do outro lado, Babette sentada na cozinha exausta de cozinhar e de servir, em meio a uma grande bagunça e pilhas de louças para lavar mas muito feliz.
As irmãs vendo tudo isso, vão até Babette e agradecem dizendo que fora uma grande festa e dizendo que sentiriam muita a perda da querida Babette. Mas para surpresa de ambas Babette responde que ficaria ali, pois tanto viajar para França como viver em Paris seria muito caro.
Mas e os Dez mil francos de seu prêmio? Perguntaram as irmãs.
Babette faz a grande revelação, gastei todo o dinheiro fazendo a festa. Mas não se assustem – ela diz as irmãs: é isso que custa um belo jantar no Café Anglais de Paris; onde eu era chefe de cozinha.
Restauração de vidas e relacionamentos como fruto da graça é o que representa essa história. A festa de Babette é uma parábola sobre a graça restauradora: um presente que custa tudo para doador e nada para quem recebeu. Uma dádiva poderosa capaz de reconciliar relacionamentos e restaurar vidas.
Babette é um exemplo de como ações graciosas podem mudar a vida das pessoas. E que se mudarmos nosso modo de ver muitas coisas podemos perdoar e restaurar relacionamentos. Por isso foi um livro de grande sucesso, ao ponto de virar um filme. Ela fala da história de nossos relacionamentos e vidas que precisam ser tratados com graça. É um reflexo da expressão ensinada por Jesus – quando clamamos a Deus dizendo: “perdoa as nossas dívidas assim como perdoamos aos nossos devedores”. Na verdade, nós cristãos não podemos esquecer que reconciliação restauradora é o centro do Evangelho. Portanto é central também em nossos relacionamentos. Assim precisamos partir desse ponto para podermos trabalhar a restauração em nossos relacionamentos.